BRASIL-EUROPA
PROCESSOS CULTURAIS EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS

 
 
Batalha. Foto A.A.Bispo 1985. Copyright. Arquivo ABE
Desde os primeiros anos do movimento de renovação de perspectivas e da prática cultural na década de sessenta do século XX e que levou à fundação da organização que hoje tem a sua continuidade na A.B:E. e no I.S.M.P.S., os elos com personalidades e instituições portuguesas foram particularmente estreitos.


Esses elos foram marcados por diversidade quanto a correntes, orientações e mesmo posicionamentos político-cullturais. No âmbito da pesquisa e da prática musical, interagiram no movimento tanto representantes de correntes estéticas de vanguarda como daqueles preocupados com a herança cultural que se percebia como ameaçada. Neste último caso, encontrava-se o movimento gregoriano, que perdia o seu significado no âmbito das reformas pós-conciliares.


Gregoriano e processos culturais: Coral Gregoriano Nova Difusão


A orientação a processos defendida pelo movimento levou à procura de novas perspectivas para o estudo e o cultivo do Canto Gregoriano no contexto brasileiro. Múltiplas questões de relevância músico-cultural relacionavam-se com o estudo das concepções estéticas do Gregoriano remontantes à época da restauração católica do século XIX, e à paleografia. Consequentemente, criou-se um círculo de estudos gregorianos, de notação e análise para a procura de novos caminhos teóricos e da prática, revendo-se a tradição do movimento gregoriano marcada sobretudo pela Abadia de Solesmes, na França.


Esse grupo experimental - coral gregoriano da Nova Difusão -, manteve, sob a direção de Eleanor Dewey -, estreitos elos com o movimento gregoriano em Portugal, muito mais conservador do que as tendências brasileiras quanto à tradição de Solesmes e a concepções litúrgicas do passado pré-conciliar. A crise do movimento gregoriano na esfera da prática de culto foi assim acompanhada por tentativas de procura de novos caminhos e perspectivas em círculos voltados à pesquisa.


Novos Caminhos, Solesmes e o movimento gregoriano de Portugal


Já no início do programa de interações na Europa, em 1974, procedeu-se a uma visita à Abadia de Solesmes para contatos e observações quanto a desenvolvimentos e iniciativas. Nesses encontros intensificaram-se os elos com o movimento gregoriano de Portugal. Este era representado primordialmente pela Dra. Júlia d‘Almendra, uma das raras pesquisadoras doutoradas no mundo de língua portuguesa, diretora do Instituto Gregoriano de Lisboa, a maior, mais bem instalada e influente instituição de nível superior do gênero.


Tendências restaurativas do movimento gregoriano em Colonia e Portugal


O contato com essa especialista, que levaria a estreitas relações apesar de diferentes posicionamentos, coincidiu com a criação de uma Schola Cantorum na Universidade de Colonia. Diferentemente do desenvolvimento que ocorria no Brasil, registrava-se assim na Alemanha tendências de revitalização do movimento gregoriano. Ainda que distinto dos intuitos do programa renovador em andamento, cumpria considerar esse renascimento de concepções e práticas conservadoras, o que foi feito em relato publicado no órgão do Instituto Gregoriano de Lisboa.


Proximidades e diferenças de concepções em Portugal e no Brasil


Trocas de idéias com Júlia d‘Almendra a respeito dos caminhos da pesquisa e da prática Gregoriana no mundo lusófono deram-se por ocasião do Congresso Internacional de Música Sacra levado a efeito em Bonn e em Colonia, em 1979.


Desde então Júlia d‘Almendra manteve-se em contato com as iniciativas no âmbito Europa/Brasil. Nova oportunidade para um encontro luso e brasileiro na área deu-se em Roma, em 1985, por ocasião do Congresso Internacional de Música Sacra, no qual participaram vários representantes do Brasil e de Portugal. Ao lado das sessões do Congresso, ofereceram-se oportunidades para encontros e troca de idéias relativamente à situação do cultivo e dos estudos de Gregoriano em Portugal e no Brasil, constatando-se também aqui diferenças quanto a intentos e concepções.

Batalha. Foto A.A.Bispo 1985. Copyright. Arquivo ABE

O Gregoriano no estudo histórico da expansão portuguesa na era dos Descobrimentos


Em 1998, o Instituto Gregoriano de Lisboa colaborou com o simpósio internacional planejado pelo I.S.M.P.S. no âmbito do seu programa pela passagem de Hongkong e Macau à China e levado a efeito em diferentes cidades de Portugal, sendo organizado no país por diversas entidades. O coro do Instituto foi responsável pela parte musical de missa solene celebrada no Mosteiro da Batalha.


Essa participação reatualizou uma discussão de décadas, uma vez que salientava-se nas discussões o papel do Gregoriano no processo de expansão portuguesa no mundo extra-europeu, em particular no Oriente.


Esses estudos de fontes havia trazido à consciência o papel desempenhado pelo Canto Gregoriano na política religioso-cultural de Portugal, nas fortalezas e na formação de comunidades no Brasil, no Oriente e na África. Havia demonstrado também as repercussões do Concílio Tridentino no mundo extra-europeu e consequentemente os esforços de revitalização gregoriana em algumas igrejas principais. Neste sentido, aproximou-se o movimento gregoriano da concepção propugnada pelo programa de interações euro-brasileiro da A.B.E. de uma orientação da atenção às inserções do Gregoriano em processos e da sua função de agentes de desenvolvimentos.


 
Julia d'Almendra e N. Jeandot 1981. Foto A.A.Bispo.Arq.ABE


Batalha. Foto A.A.Bispo 1985. Copyright. Arquivo A.A.Bispo