BRASIL-EUROPA
PROCESSOS CULTURAIS EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS

 
 
Bruxelas. Foto A.A.Bispo. Copyright A.B.E.

Commission des Communautés Européennes, Bruxelles


A transpassagem de fronteiras nacionais e divisões políticas na Europa, aproximações e integrações de contextos culturais, relações internacionais no passado e no presente constituiram, desde o início, características determinadoras do programa de interações preparado no Brasil desde a segunda metade da década de 60 e iniciado na Europa em 1974 graças ao Serviço de Intercâmbio Acadêmico Alemão (DAAD).


Esse programa, dirigindo a atenção a processualidades, procurando superar formas de pensar e agir a partir de esferas determinadas, levou a que se discutisse a divisão européia em blocos políticos, as divisões de estados e nações e que se acompanhasse desenvolvimentos segundo visões abrangentes.


Essa problemática foi tematizada já em primeira visita a Berlim, ainda dividido, no início de 1975. Nessas conferências, as atenções, partindo de questões de organologia e museologia de cultura de povos segundo enfoques do programa, consideraram a necessidade de conhecimento de tendências do pensamento e da prática do Leste.


Em 1976, realizou-se um encontro em Bruxelas que marcou desenvolvimentos dos anos que se seguiram.


Nessa ocasião, recapitulou-se o complexo temático tratado em Berlim, trazendo à consciência as dimensões amplas decorrentes da discussão organológica: do instrumento passou-se, assim, segundo o programa de interações, à consideração do edifício cultural no qual os instrumentos se inseriam.


A transformação que essa discussão trazia para a Etnomusicologia, - transformando-a antes em Músico-Antropologia-, como defendida no programa, foi salientada durante os encontros.


Museu de instrumentos Bruxelas. Foto A.A.Bispo. Copyright A.B.E.

Contatos com o Museu Real de Instrumentos Musicais tiveram continuidade nos anos que se seguiram em outros quadros institucionais, aquele do Departamento de Etnomusicologia do instituto de pesquisas da organização pontifícia de música sacra criado em 1977, e do Forum internacional para questões de estudos inter- e transculturais e de pedagogia comparada, representante da Sociedade Brasileira de Musicologia na Europa.


As relações com círculos de Bruxelas na pessoa de René de Maeyer decorreram paralelamente a estadias e a atividades de Francisco Curt Lange no âmbito do programa euro-brasileiro em Colonia.


A partir destes trabalhos, acompanhou-se de perto os preparativos que levaram à realização dos colóquios internacionais de influências recíprocas entre a Europa e a América Latina do séclo XVI ao XX realizado pelo Museu de Instrumentos Musicais do Conservatório Real de Bruxelas sob a direção de René de Maeyer no centro Borschette das Comunidades Européias em 1983, 1984 e 1985.




Retomada de objetivos do programa euro-brasileiro


Em 1983, Bernadette César solicitou a Christine Simeone a organização de um encontro por ocasião do quarto centenário de nascimento de Jean Vaisseau SJ, uma idéia de Anibal Cetrangolo. Esse musicólogo italiano  mantinha relações com F. Curt Lange quando este era hóspede do programa euro-brasileiro em Colonia. Já se destacara como organizador de um encontro dedicado à história do patrimônio cultural latino-americano em Roma, em 1980.


Essas iniciativas não eram pioneiras, pois a consideração do papel desempenhado pelos jesuítas na história da música da América Latina nas suas dimensões globais já tinha sido tema de trabalhos anteriores do programa euro-brasileiro, constituia objeto de estudo de central importância do instituto da organização pontifícia de música sacra e tema de abertura dos trabalhos do Simpósio Internacional Música Sacra e Cultura Brasileira no Pátio do Colégio, em 1981.


Nessa época ja se realizara a Semana de Música Alemã-Brasileira e, em 1983, efetivava-se a Semana de Música França-Alemanha-Brasil no âmbito do Forum Internacional.


A Europa dos então 21 países esteve representada nos colóquios de Bruxelas pela Subcomissão de Universidades da Assembléia Parlamentária do Conselho da Europa por M. Manuel Nunez Encabo.


O evento vinha de encontro às recomenções sobre cooperação universitária entre a Europa e a América Latina que seriam aprovadas em 1986.


Livio Missir representou a Divisão „Problèmes du secteur culturel“ do Secretariado Geral da Comissão das Comunidades Européias. Roger Dehaybe representou a Comunidade Francesa da Bélgica.


Nesse sentido, realizou-se na residência de René de Mayer um encontro com representantes do programa eurobrasileiro de interações em 1983 para a pré-discussão dos temas a serem tratados com relação ao Brasil e a presença de pesquisadores brasileiros nas várias edições do evento. Sugeriu-se, nessa ocasião, entre outros nomes, o de Luís Heitor Correa de Azevedo que, por sua vez, também fêz sugestões de pesquisadores.


Três complexos temáticos desenvolvidos no âmbito do programa euro-brasileiro foram salientados no simpósio: o da história da recepção musical na América Latina, o antropológico cultural e o da diversidade nas suas relações com critérios e concepções de unidade.


A perspectiva antropológica no desenvolvimento de um pensamento integrativo


No pronunciamento por parte do programa euro-brasileiro, lembrou-se que a perspectiva antropológica não podia limitar-se à uma acentuação de enfoques etnológicos no sentido convencional do termo no tratamento de processos culturais em reciprocidade América Latina/Europa.


O edifício cultural introduzido nos países colonizados e missionados e que se manifestava em diversificadas expressões possui concepções antropológicas ou simbólico-antropológicas intrínsecas, que necessitam ser consideradas. Trata-se, assim, antes de uma análise de concepções e imagens já existentes nas suas transformações.


Essa orientação, defendida no programa de interações euro-brasileiro, tem consequência para os estudos europeus, uma vez que implica em estudos de fundamentos de um edifício cultural abrangente e de processos dele derivados através dos séculos. Supera-se, assim, no sentido do programa, delimitações geográficas da história cultural, da música e das artes, entre o europeu e o extra-europeu do Folclore e da Etnologia, e perspectivações nacionais, contribuindo-se à aproximação e integração européia.


A diversidade como foco de atenções e relações com diversas concepções de unidade


No segundo caso, retomando-se o tema do Simpósio Internacional de São Paulo de 1981 - Diversidade na Unidade, Unidade na Diversidade - lembrou-se que a consideração prioritária da Diversidade não poderia deixar de considerar as suas relações com concepções de unidade.


Esta não podia ser compreendida apenas em referenciações nacionais, étnicas, religiosas oiu outras. Havia concepções de unidade intrínseca à diversidade no edifício cultural transplantado no decorrer da colonização que exigiam ser analisadas e consideradas nas suas relações com outras concepções de unidade.


A discussão devia, assim, ser conduzida segundo uma diferenciação crítica do assim-chamado monopluralismo. Essa discussão teve continuidade em encontro dedicado à Antropologia Fundamental no centro da Fondation Royaumont, em 1985, preparando a fundação do I.S.M.P.S..